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domingo, 12 de dezembro de 2010

Para quem não conhece, esse é Julian Assange. Por causa dele e de alguns outros, certamente, não estamos mais na Idade Contemporânea. http://www.ted.com/talks/view/id/918

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Preciso escrever sobre Noel



Fui a um debate com João Máximo sobre Noel Rosa, produzido pelo projeto Toca-Livros, na Caixa Cultural do Rio (www.tocalivros.com.br). E me dei conta que escrevo pouco ou quase nada sobre esse, carinhosamente falando, safado que foi o Noel de Medeiros Rosa.
O meu primeiro alumbramento que tive com Noel se deu graças à gloriosa e potencialmente revolucionária inter-netch. Precisamente em outubro de 2005 venho passar a primeira temporada em Vila Isabel, temporei dois meses inesquecíveis numa república anárquica de estudantes – como sempre deve ser - “A Robertinha”, na rua Jorge Rudge.
Em poucos dias percebi que Noel era uma referência constante no bairro: nome de túnel, de shopping, de casa que conserta roupa (“Com que Roupa”), estátua, busto, e uma coisa ímpar que acho que não existe pareia no mundo: as calçadas da avenida principal do bairro são copacabanamente desenhadas com partituras, não só de Noel, mas de compositores chaves para o samba carioca. Então, para se ter uma idéia, dá para se pular de uma mínina para uma semínima e solfejar uma melodia. Descobri dia desses que o repertório das canções calçadadas foi escolhido pelo Almirante, amigo de Noel e líder da primeira e única banda que Noel participou: o “Bando de Tangarás”.
Mas voltemos para como foi minha descoberta, simples e retamente: comunidade Noel Rosa no Orkut (http://www.orkut.com/Main?hl=pt-BR#Community?cmm=51164). Claro que já conhecia os clássicos, mas só. Meses antes estava encafurnando numa loja de discos e fiquei hipnotizado por um box de Noel chamado Noel, pela primeira vez, 229 canções originais, 14 cds. Custava mais de 500 reais e fiquei a ver navios na orla da penúria.
Um belo dia nas ondas das madrugadas, quando parecia mais uma vez que dormiria chateado com o desperdício de tempo de navegagem, abro despretensiosamente a comunidade Noel Rosa do Orkut. Numa das enquetes estava escrito Noel pela primeira vez. Resultado: varei a noite chupando wma de originais e não acreditando no poder de solidariedade embutido nos seres humanos que de vez em vez é extravasado nessa rede de peixe grande. O cara que comprou por mais de 500 pratas o tal Box estava disponibilizando para o mundo uma raridade da história da música na América Latina, e um outro cara numa lanhouse da comunidade do Borel estava tendo a possibilidade igual a minha de estar dominando o mesmo material.
Dos 14 cds disponibilizados baixei primeiramente 6 para o meu pen drive que serviu como trilha sonora durante a temporada na Robertinha. O que me chamou de imediato a atenção era no sistema rudimentar de gravação da época, que dá a impressão de estarem gravando ao redor de um único microfone pendurado no teto de um quarto.
Para 1930 era a coisa mais moderna que poderia existir: o sistema de gravação elétrico e, posteriormente, a difusão via rádio, o que seria analogamente hoje uma sensação semelhante às redes sociais. Gravar música nessa época para a geração de Noel não passava mais do que uma tiração de onda, raros os que ganhavam alguma coisa com canções e venda de discos, a música popular não havia sido ainda devidamente apropriado pelo capital.
Outra coisa que me impressionou no material era a teatralidade das canções do Noel. Favor conferir Quem dá mais?, A.B. Surdo e Não tem tradução. Pensei de imediato num musical, liguei para uma amiga cantora, o projeto ficou chocando por 4 anos, até que ano passado conseguimos formar um conjunto Rosa da Vila, de onde saíram ótimos arranjos para violão para canções como João Ninguém, Positivismo e Feitiço da Vila. Os ensaios eram aqui em casa, tive o prazer de construir amizades com músicos maravilhosos. A banda se desfez, mas neste ano, 2010, através de um contato inesperado fui me aproximando de um grupo de teatro amador da UERJ junto com o qual estarei encenando o espetáculo Rosas de Noel no próximo 14 de dezembro às 19h no Teatro Noel Rosa, da UERJ.
Para além da propaganda do espetáculo, preciso escrever sobre Noel...
Noel foi para o samba, digamos, uma entidade meio Exú misturado com Dionísio, tanto o mensageiro entre o céu e a terra – entre o morro e o asfalto – quanto o deus da farra.
Subir morros, se misturar com pessoas de outra raça e de outra classe no início da década de 30, para um bairro classe média do Rio, era no mínimo uma ousadia. Noel foi o primeiro branco classe média na música popular a romper com as barreiras de raça. Isso numa época em que se pesquisava comparativamente crânios e outros segmentos anatômicos entre raças distintas para se explicar caráter, boa índole e personalidade; uma época de franca ascendência do eugenismo, anti-semitismo e fascismo na Europa.
Outro feito de Noel que o faz, segundo Sérgio Cabral, “não necessariamente ser o maior compositor de sua época, mas sem dúvida o mais importante”, era no que tange a feitura do conteúdo de suas letras. Segundo o biógrafo João Máximo, não existia até então em música de meio de ano – música “séria”, que não seja de Carnaval – temas como pobreza, fome, mentira, bonde, credor (prestamista) etc. Noel exalava cheiro de rua, transformava em samba tanto manchete de jornal, quanto histórias contadas pela massa que perambulava pelas noites do Rio.
Essa nova maneira de letrar melodias rocambolou a história da música popular. É fato que na década de 50 houve uma enxurrada de sambas dor de cotovelo, mas depois disso esse tipo de feitura iniciado com Noel ganhou mais e mais adeptos. Bob Dylan provavelmente foi um deles...
Noel se foi aos 26 com a danada da tuberculose, morreu tamborilando a escrivaninha da cama na mesma casa onde havia nascido de parto difícil. 100 anos de nascimento serão comemorados no próximo 11 de dezembro.
Dia desses passando por um dos poucos chalés que ainda restam na Vila, imaginei o Centro Cultural Noel Rosa, onde os meninos dos Macacos e da Mangueira poderiam cursar teatro, música, cinema etc. O dono falou que estava quase que fechando com uma imobiliária, mais um arranha-céu estaria sendo planejado. Contei essa história pro João Máximo, que desapontado confessou que havia tentado algo semelhante junto com o Martinho da Vila, o projeto auspicioso tinha a assinatura de Oscar Niemeyer e seria construído na quadra da Escola de Samba do bairro. Entretanto, ganância e politicagem barraram o projeto.
Noel, dentre outros talentos, foi presenteado com o dom da profecia:
Quanto é que vai ganhar o leiloeiro
Que é também brasileiro
E em três lotes vendeu o Brasil inteiro?
Quem dá mais?

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Sarrabulho




Uma amiga veio me contar que foi à praia de Boa Viagem pela primeira vez. Não pude me conter em derramar na rede o que sinto de saudade e crueldade diante desse mar de assombro onde me batizei.

Abriram-me as portas com uma festinha na extinta maternidade do Derby – meu pai chegou a pagar hospedagem no quarto da enfermaria ao lado, onde eu mamava na mamãe, com a finalidade de saborear com sua gang o “xixi do neném”. Útero-loca-quentinha deixado pra trás, me levaram para o Edf. Monte Carlo, rua dos Navegantes, Boa Viagem, bairro onde me hospedei até concluir as faculdades mentais de medicina aos 27.
Primeiro fui doutor de amostramento em mergulhação – uma foto clássica na década de 80 evidencia um pequeno ser alienígena paramentado com roupa de neoprene, faca de caçador submarino acoplada à batata da perna esquerda, e relógio medidor de profundidades abissais em pulso direito prestes a adentrar no mar defronte ao velho e bom Acaiaca. A pixação “OS SURFISTAS” na fachada desse prédio iria me servir, anos mais tardes, como sentido e bandeira do movimento de mar em que fui fã de carteirinha com foto.
Sol, chuva, Natal, São João, nada me detinha na saga de calcular na seção de “tábuas da maré” do Diário de Pernambuco as horas em que eu deveria, com meu primo-irmão Lula, me aventurar nos swells da Pipeline recifense. Nas férias do Santa Maria comparecíamos na religiosidade da parafina em dois horários no mesmo dia: no mar seco inchando treinávamos longe do crowd as marolinhas para pegarmos, digamos, estofo surfístico; à tarde ou noite nos aventurávamos nos cachalotes. Sarrabulhos, gritos desesperados dos mais experientes “Aê, aê, aê...” eram corriqueiros nessas empreitadas hang loose em que sonhávamos na materialização das imagens Fluir do Tom Carrol, Tom Curren e Kely Slater, heróis genuínos do nosso movimento sebastianístico havaiano.
Quando Hugo Esteves, do NE TV 2ª- edição, anunciou o primeiro ataque do Tigre, meu pai, que assistia comigo ao noticiário, deu-me um tapa na perna e uma mordida no beiço: nunca mais, viu, caboclo! Daí em diante, Surf no Havaí e Caçadores de Aventuras me passavam despercebidos nas prateleiras da Videosom, soluços de maresia nessa época me eram frequentes.
Curei a primeira ressaca amorosa nas areias da Boa Viagem, onde me detive por longos minutos a meditar raiva e lágrimas até, num impulso passional, arremessar mar adentro um objeto sobre o qual havia projetado mau presságio e condecorado causador simbólico de todo o sofrimento da partilha: uma caveira em miniatura que havia adquirido no Piratas do Caribe na Disney de Orlando anos atrás. Em matéria de amor, essas mesmas areias testemunharam porres de paixão, mas acho ótimo que areia é mineral mudo que não aprendeu mímica.
O primeiro pedido de fera UFPE 2000 de medicina foi banho de mar com roupa e tudo. Se um pai de santo, eu ainda menino, estava correto em me dizer que sou filho de Iemanjá, careceu do sobrenome: Iemanjá da Boa Viagem. Em tudo que é aperto ou largura em minha vida lá vou encher a mão em concha nas águas de mainha. Antes do árduo caminho à Morada da Paz para os funerais do meu velho Bibi, via-se, à luz do dia, um ser tristonho de cuecas indo pedir a bênça à Iê Iê.
No meu último ano de BV, resolvi, num ímpeto inconsciente de saudade, que deveria correr na areia e, ao final, me presentear com mergulho. Consegui me despedi à altura apesar dos arranha-céus.
Nos anos que correm, venho me deliciando com mainha muito de vez em vez, quando costumo pedir bênça e refazer votos de batismo, mas moro no Riocife, terra-água que me faz transitar nos sarrabulhos marolentos da saudade.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

uma saída nem de banda nem de bunda. (por Bernardo Cotrim)



Carta Aberta ao Jornal O Globo


Comecei a ler O Globo diariamente aos 6 anos de idade. Meus pais, leitores “compulsivos” (como se diz por aí, “minha mãe lê até bula de remédio”), eram assinantes do jornal e o hábito de iniciar o dia folheando as páginas d’O Globo foi rapidamente imitado por mim. Primeiro os quadrinhos, depois o caderno de esportes, até passar a ler o jornal “de cabo a rabo”. Conservei essa rotina por longos 24 anos. Até o dia de hoje, mantive o costume de iniciar o meu dia “sujando os dedos de tinta”, manuseando o papel.

É fato que, nos últimos anos, passei a fazê-lo sem o menor prazer. A notícia cada vez mais editorializada, os toscos subterfúgios para disfarçar os interesses econômicos e a opinião conservadora debaixo de um falso manto de “imparcialidade” cada vez mais difícil de sustentar.

Não que eu tivesse ilusões de ser O Globo um jornal isento. Sei das relações promíscuas dos membros do clã Marinho com os porões da ditadura civil-militar; guardo na memória o apoio às privatizações, o imenso destaque aos colunistas que vomitam obviedades preconceituosas e são louvados como “formadores de opinião” (de quem, cara pálida?), mas frente à decadência do velho JB (que, enfim, fechou suas portas, depois de longa agonia) e a fragilidade dos demais jornais, O Globo resistiu como alternativa de informação.

No entanto, gente ao processo de transformações que o Brasil viveu (e vive) durante o governo Lula, vocês ultrapassaram os limites do bom senso. Transformaram-se em um panfleto sujo, jogaram todos os manuais de jornalismo no lixo, assumiram o papel de “bastião da resistência” que os frágeis partidos de direita não conseguiram sustentar. Passaram a utilizar suas páginas para antecipar os discursos na tribuna que os jereissatis, fruets e virgílios, espumando de raiva, despejavam nas tribunas no dia seguinte.

Passei bons anos justificando para mim mesmo a manutenção da assinatura. A ausência de uma alternativa que me permitisse manter o hábito de ler um jornal impresso, a necessidade de saber o que “eles” (a direita retrógrada, anti-povo) pensam, os dois artigos semanais do Veríssimo...

Hoje resolvi encerrar o amargo ciclo de masoquismo e autoflagelação que se tornou a leitura d’O Globo. Os frágeis argumentos em que me agarrei aparecem ainda mais patéticos quando confrontados com a realidade: estou ajudando a financiar uma peça publicitária para a campanha do Serra. O Globo, há anos, deixou de ser um jornal digno do nome.

Vejamos: nos últimos dias, um escândalo de enormes proporções atingiu o governo tucano do RS. Qual o espaço destinado à cobertura do caso? Por que a prisão do governador do Amapá justifica a inclusão de uma foto do Lula na capa? O princípio da isenção não deveria fazer com que a “arapongagem” do governo Yeda (que espionava até crianças!) também surgisse na capa acompanhada de uma foto do Serra?

Poderia listar, no mínimo, um caso de jornalismo marrom por dia publicado nas páginas d’O Globo nos últimos 10 anos. E, ao mesmo tempo, sou incapaz de dizer qualquer coisa que beire a racionalidade para justificar a minha permanência como um finaciador dessa sujeira.

O fato é que, felizmente, hoje existem inúmeras opções de comunicação ao alcance de um “clique”. Uma ampla rede democrática de comunicação social constituiu-se na internet, várias vezes com maior agilidade de informação (“furando” os jornalões comprometidos com a vontade dos seus donos e com o lucro, e não com a liberdade de imprensa), e, sem sombra de dúvida, muito mais comprometida com a veracidade dos fatos.

Por último, quero me solidarizar com os vários profissionais que aí trabalham por necessidade e que não compactuam com a farsa que o jornal se transformou. Talvez, se o jornal admitisse que tem “lado” e o expressasse de forma mais explícita nos editoriais, sem manipular a pauta inteira de cada edição (como fazem veículos bem mais sérios e respeitáveis, como a Carta Capital), eu não estivesse hoje escrevendo essa carta. Mas prefiro pagar para ser enganado levando o meu filho em shows de ilusionismo, ao invés de servir como número nas estatísticas de assinantes que o setor comercial d’O Globo apresenta para os seus ricos anunciantes.

Bernardo Cotrim

Ex-leitor

PS: Como sei que minha carta nunca será publicada por vocês, tomo a liberdade de divulgá-la para os meus amigos e familiares. Talvez existam outras pessoas tão indignadas quanto eu, precisando apenas de um “empurrãozinho”.


sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Um amigo (Otávio Brum) me pediu para espalhar os seus dotes proféticos - sobre a Mega Sena acumulada de amanhã 21/08/10

Uma dica para ganhar na Mega Sena acumulada a partir de uma novela da Globo


Não são meus parcos conhecimentos matemáticos que poderão levá-los ao prêmio de R$ 31 milhões da Mega Sena, ou a outras premiações milionárias futuras. Nada disso. Minha habilidade com os números se resumem nas 4 operações básicas, pelo amor à música e ao jogo de xadrez.

Tampouco irei oferecer algum esquema mirabolante, pois foi com Bukowski que aprendi o quanto isto não funciona. Inclusive, isso me levou ao meu primeiro divórcio – mesmo que não tenha levado adiante a minha ideia de virar um apostador costumaz em cavalos.

Desculpem o interlóquio. Mas sou virginiano, preso aos detalhes, e preciso me apresentar minimamente para tentar convencê-los da seriedade de minhas ponderações. Nunca fui um grande vitorioso em nada na vida. Portanto, também não é nenhuma história autobiográfica que lhes sirvam de exemplo que lhes ofereço.

O que vou lhes apresentar é algo da Toscana. Mais precisamente da Toscana de Sílvio de Abreu, por mais tosco que lhes pareçam. Mergulhando no universo da fantasia e aprendendo a ler nas entrelinhas da Arte, absorvendo o fulgor criativo das mentes brilhantes que produzem o que há de melhor na teledramaturgia brasileira, verão o quanto poderão aprender sobre o domínio da estatística. E é isto o que nos interessa: a passione pelos números!

E é esta a minha grande pretensão: conduzi-los e ajudá-los a desbravar este mundo da criação. Pois não é o domínio da estética mas o da estatística que eleva Sílvio de Abreu a condição de gênio. Verificaremos que não são só histórias magistrais que podemos esperar do autor. Não só queremos como esperamos muito mais: as 6 dezenas da Mega Sena, por exemplo.

Vamos aos fatos. O primeiro acerto é o de não precisar onde fica o sítio de Totó. Aqui já temos a primeira lição de freio à impulsividade imaginativa. Totó não é o cachorro, mas o personagem de Toni Ramos, como poderiam pensar àqueles acostumados ao era uma vez... Bom, o sítio fica em Toscana e cada um pode imaginar por si só qual o lugar mais adequado para situá-lo na região. Isto é uma delícia e faz com que cada um tenha seu sítio próprio, único, idiossincrático diria, como se estivéssemos lendo um livro ao invés de estar assistindo a novela das oito.

Sobre isso que disse agora, não estou muito certo. Alguém que assista diariamente a novela pode me alertar de que o sítio fica no lugar tal e tudo se ir por água abaixo. Mas isto também pode acontecer ao marcarmos o bilhete, tomem cuidado! Porém, ainda assim nada está completamente perdido. Afinal se errarmos em um ponto, ainda nos resta sonhar com a quina...

Pelo que entendi, Totó é filho de Bete Gouveia. Foi criado longe da mãe porque era um bastardo. A mãe não sabia que o filho estava vivo e que morava na Itália. Bete mora em São Paulo, aqui no Brasil. Ah, sim! Não podemos esquecer dos números. Afinal, nosso real interesse é o de ganhar na loteria. Portanto fiquem atentos: na região da Toscana vivem 3 milhões 619 mil e 872 habitantes, já na Itália há 60 milhões 303 mil e 800 pessoas. Mas acho que isso não importa muito. Nosso interesse é por apenas 4 italianos neste universo todo: Totó, Agnello, Agostina e Berilo.

Agnello e Agostina Mattoli são filhos de Totó. Berilo Rondelli casou-se com Agostina na Itália. Porém migrou para o Brasil. Para São Paulo, cidade de 11 milhões 37 mil e 593 habitantes. Maior cidade do hemisfério sul, sexta maior do mundo. Para não perder o embalo dos números, em nosso País vivem 191 milhões 480 mil e 630 indivíduos.

Toni Negri, também italiano, nos interessa muito. Mas não se trata de um quinto italiano em nossa lista. Deixamos de fora. É só por que lembrei de que era ele que falava o quanto fica impressionado com a criatividade das pessoas que lutam pela sobrevivência em países ainda em desenvolvimento. Mas nossa criatividade para descolar algum não nos interessa. Porque só nos resolve o aqui e agora e permanecemos sempre duros! Estamos mesmo de olho é no quinhão milionário das loterias acumuladas. Isto sim resolve definitivamente o problema de qualquer um!

Berilo, ao contrário de Negri, é um italianinho safado. Quando chegou à Terra da Garoa tratou de juntar seus trapinhos com Jéssica da Silva Rondelli. Jéssica é filha de Olavo da Silva. Olavo também é o pai de Totó, portanto avô de Agostina. Fiquem atentos pois são nestas entrelinhas todas que estão os segredos que devem ser desvendados para se tornar o maior vencedor de loterias que se possa ter notícia! Vencer quantas vezes quiser, ou melhor, apostar. É algo para deixar o falecido João Alves com suas duzentas e vinte e uma premiações no chinelo!...

Agnello quando chegou ao Brasil teve um affaire com Stela Gouveia. Estela é esposa de Saulo Gouveia. Saulo é irmão de Totó e tio de Agnello. Foi um romance rápido. Agnello tratou de sair por aí, pelas ruas de Sampa e procurar carne nova. Quem encontra? Lorena Gouveia! Lorena, filha de Stela e Saulo. Não é fantástico? Agora sim estamos quase no final. Algo sem muita relevância neste mundo de probabilidades, mas é mais um dado que temos que acrescentar. Afinal, não podemos deixar nenhum detalhe de lado se quisermos apreender bem as técnicas que irão nos transformar em grandes ganhadores! Olavo está de casa nova. Comprou um bela mansão. Se ganharmos o prêmio, poderemos fazer o mesmo. Agora Bete Gouveia tem vizinho novo: o pai de Totó mora na casa ao lado.

Agora me digam: alguém que escreve com tamanha propriedade este mundo de encontros possíveis, alguém que domina de tal forma o magnetismo dos afetos e os aproxima de forma tão nobre como o horário da novela das oito, enfim, alguém que desconhece o improvável e daí faz sua arte, alguém que manipula sonhos de maneira tão sutil, alguém que nos faz crer que tudo realmente é possível, não é mole para este alguém nos dizer quais as seis dezenas que serão sorteadas?

Sim, se querem ganhar o grande prêmio da loteria, escrevam para o Sílvio de Abreu e digam: ó grande Mago das Probabilidades em quais números devo apostar? Ou vocês acham que quem domina a probabilidade desta forma não vai saber quais os 6 números de um universo de 60 que serão sorteados?!? Mãos no telefone, dedos no teclado. Arranquem esta informação do autor e não esqueçam de meu quinhão – já que fui eu quem lhes deu a dica!

Não os deixem convencer de que o universo dos encontros possíveis dos personagens da Globo se dão por relações incestuosas onde todos – ricos e pobres – vivem uma relação por demais estreita só por causa do fato da Cidade Cinematográfica ser muito pequena. Não engulam esta desculpa! Sabemos o quanto o Projac é grande e a empresa rica e poderosa! Não é pelo tamanho da Cidade Cinematográfica que faz com que todos os personagens se encontrem e convivam novela após novela, seja na povoada Índia ou metrópoles como São Paulo, mas por que os autores são verdadeiros Magos da Probabilidade!

E não é só o Sílvio não. Todos eles sabem quais os números serão sorteados! Podem notar que isto se repete em todas as novelas, em todos os horários, em todos os autores! Escrevam e tirem deles esta informação! Se não disserem, twittem por aí: só não ganhei na loto porque a Globo não quis.

Ah, sim! Também não os deixem convencer de que tudo é licença poética. Por mais platônicos que sejam, por mais que expulsem a poesia e os poetas de suas repúblicas. Não é verdade! Sempre se utilizam desta desculpa para suas cagadas! Vão tentar convencê-los de que não são Magos da Probabilidade, mas que se utilizaram de licença poética... Isto é balela e a desculpa não cola mais! Digam: licença poética o caralho! Pode ir desembuchando os números logo, ó Mago da Probabilidade!

Mas cuidado, muito cuidado! Eles são seres muito imaginativos, apesar de não parecer tanto. Mas se assistirem ao Vídeo Show saberão o quanto são grandes, todos eles! Previnam-se! Poderão tentar inventar uma nova versão do “licença poética” quando perceberem que a casa caiu e que agora todos sabem que são Magos da Probabilidade!

Podem, por exemplo, tentar convencê-los de que não são Magos da Probabilidade, mas apenas autores. Meros operários das letras. Mas que no mundo da Literatura os personagens têm vida própria. Que os personagens da Globo, como qualquer ser, estão sob a Lei Divina. Que os personagens sofrem de um Karma coletivo muito grave e que são ignorantes, tendo que reencarnar já na próxima novela que segue para tentarem consertar seus erros. Mas são mesmo muito estúpidos e repetem os mesmos erros e assim nunca equilibram suas balanças e tornam a pecar nas mesmas coisas e, mais uma vez, reencarnam na outra novela e não há final feliz que amenize seus karmas. Que eles, os autores, há muito deixaram de representar a realidade social brasileira. Agora retratam a miséria espiritual de toda a humanidade... Eles falam isso só porque são magos e como todo mago que se preze têm seus conhecimentos cósmicos, oras! Não os deixem seduzi-los pelas palavras amenas, e insistam: tá, agora me inicie nos segredos da estatística, ó grande Mago da Probabilidade!

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Na cova dos leões Marinho


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Uma coisa é escorregar para dentro de uma jaula com quatro leões famintos, estrebuchar-se no laguinho onde eles se banham, ao se levantar pisar no rabo do leãozinho filhote, finalmente receber o rruauurrr recheado do bafo quente do Rei e esperar pela dentada mais radicalmente mortífera possível.
Outra coisa é estar nos estúdios de telejornalismo no Jardim Botânico – RJ, sendo candidata à presidência mais non grata da família Marinho e estar sentada na mesma mesa à espera de uma entrevista ao vivo (co)mandada pelo casal mais-que-perfeito Bonner & Bernardes para mais de 40 milhões de brasileiros. Era segunda à noite, 9 de agosto de 2010.
Pelo grau de hostilidade da Emissora com a candidata, apostaria nas caretas do porteiro, passando pelo ascensorista, mordomos, até chegar na mesa de tortura canibal. O servente que mais fechasse o tempo ganharia um verão todo de férias. O assistente de câmera deve ter deixado cabos pelo chão; a maquiadora, cremes para salientar o suor; a contínua, café com gelo e o operador de áudio (esse deixou passar para os 40 milhões), uma fala de andróide retardado na resposta de Dilma a uma das perguntas.
O jogo imposto pelo casal era fair play só para eles próprios, “vamos para o que interessa...” Ué, mas eles haviam acabado de perguntar sobre o desinteressante? Quiseram num lance digno de palmas do publicitário Goebbels inverter a história: Dilma guerrilheira para Dilma torturadora (“que maltrata os colegas de trabalho”). Insinuaram que o Brasil não havia crescido tanto assim perante outros países apesar de todos os outros candidatos, inclusive o próprio Serra, admitirem isso. Taxaram-na de inexperiente mesmo após já ter assumido secretarias municipal e estadual, além do segundo maior cargo da hierarquia do governo federal, como ela mesma frisou. Pintaram o sete, fizeram o escambau.
A raiva estava presente nos sorrisos falsos, o teatro era romântico: acusadores de extrema índole e honra perante o réu mais infortunado de virtudes humanas, que ficava claro o seguimento da sentença para uma pena capital. A impressão que dava é que, devido ao explícito clima de precipitação de um ringue em toda a entrevista, depois do anúncio do comercial, Dilma e Bernardes se levantaram e se puseram a puxar os cabelos uma da outra, as duas se mostrando línguas a cada puxavão.
Dilma passou no vestibular, medicina USP com engenharia ITA. Apesar de ter falhado um pouco a voz devido a uma possível taquicardia sinusal desencadeado por forte descarga noradrenérgica, seu timbre é rouco e grave o suficiente para uma mulher ser bem ouvida numa televisão. Mesmo apesar da indesculpável falha de áudio de uma das maiores emissoras do planeta: com tecnologia audiovisual suficiente para ouvir os gritos de uma borboleta e filmar genes em mutação.
Acho que mutação é um exemplo interessante. Foi a primeira vez que vi uma certa afobação, uma dose de ansiedade, que nessa ocasião simbolizava um tenso clima de medo advindo, de maneira surpreendente, da poderosa plim-plim. Bonner & Bernardes, símbolos do patrão-patroa, estavam mais que eufóricos e, por isso, menos-que-perfeitos. A aleatoriedade das mutações genéticas beira os limites entre a ciência e outras interpretações, como as religiosas e metafísicas. Não há maneiras de prever tamanho grau de improbabilidade, daí suporem a existência de milagres.
Graças a Deus que o que aconteceu segunda passada no Jornal Nacional não foi um milagre, mas uma mutação diferente, uma notável evidência que estamos em outra Era. Seríamos avatares midiáticos em busca de uma Pandora ainda inexistente, aliás, que jamais existiu, mas que vem mostrando raios de uma aurora cibernética? Em outras palavras, já é possível perceber arranhões no globo prateado, assim como em outros símbolos de grandes corporações de mídia? Estaríamos, através da grande rede, pescando nosso próprio peixe?
Mas voltemos aos leões. Estavam por demais famintos, perderam a presa. Era uma cobra criada, que mesmo em perigo conseguiu ensaiar umas “butadas”.
Entre leões e Marinhos, as focas batem palmas e o urso polar desperta bocejo.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

política é bom e eu gosto



Política não é careta, nem coisa de picareta. Existem caretas e picaretas na política, assim como em qualquer ramo de atividade e campo do conhecimento humano.

Nasci em 1978, próximo à anistia do Geisel, aos 6 levantava a cabeça para observar nas faces dos adultos a euforia seguida de desencanto em relação às Diretas; com 10 anos me lembro do velho Ullysses, a quem meu pai respeitava como um sábio monge, sendo aplaudido com um livro em punhos, e em cuja capa havia um desenho engraçado da bandeira pela metade.

Quando o presidente-jet ski – eu adorava suas peripécias – desceu a rampa com aquela cara de “a história me absolverá”, segurava a mão de sua inseparável namorada, morria de pena deles, contava eu 14 anos. Bom, a história não o absolveu, mas o povo alagoano sim...

Aos 20, ainda leitor de Veja e recém saído de um colégio católico e fascista, me prendeu na TV a imagem de tensão do Pedro Malan durante uma quebradeira brasileira no início do segundo governo FHC, sobre o qual dizia eu a todos em 1993 ser muito mais preparado que o Lula. Chegava a repetir durante o recreio: “é a mesma coisa de eu (aos 15) querer entrar na faculdade”.

Algum tempo depois, através do rádio de um carro com as portas escancaradas, no meio de uma multidão no centro do Recife, chorei durante o primeiro pronunciamento do Lula eleito, prometendo como primeira medida acabar com a fome dos brasileiros. Já estava cabeludo, descolado e metido na política estudantil, 24 anos.

Agora aos 31, vendo finalmente o Serra sorrir ao ser fotografado, fui almoçar com um colega de trabalho e nos caiu justamente essa ficha aparentemente óbvia, mas imbuída de um valor urgente de tuitagem: desde que nasci a grande mídia me tenta demonstrar através de fontes infalíveis e fatos incontestáveis que a política não presta, e que, portanto, não serve para as pessoas que tentam se manter na linha: os que não sonegam, não atrasam o boleto do cartão de crédito e não roubam vaga de estacionamento de shopping. O sentimento que paira é justamente o contrário, ai de nós pensarmos em atuar politicamente, afinal de contas, onde estaríamos querendo chegar?

Do síndico do prédio ao presidente da república, ninguém escapa à desconfiança de ter almejado um cargo político. Muitos nem cogitam a possibilidade de atuar politicamente, apesar de alguns terem o maior talento pra coisa, por temerem a chegada do inevitável dia em que se sujarão, se venderão, pois pensando bem, para o senso comum, é impossível governar sem se aliar aos poderosos, sem cantar parabéns, comer do bolo e ainda ter que apagar as velinhas. No entanto é sempre bom ter cuidado com idéias queijo-queijo, principalmente as mais obviamente corretas.

Que tal perguntarmos o porquê de nos embutirem tanto medo em relação a uma atividade tão essencial, diria imprescindível, ao Estado Democrático de Direito numa jovem República federalista e presidencialista como o Brasil? Seria uma maneira de cuidado da imprensa perante o cidadão brasileiro? Uma tentativa de aviso ao inocente, que por um descuido emocional democrático-republicano possa vir a se tornar cego em relação às agruras que um posto público comporta? A selvagem disputa de poder, a possibilidade desse mesmo cidadão ser coagido por malfeitores e exposto a denúncias falsas de corrupção... Ou seria o alcance de um objetivo, já bastante camuflado, de cada vez mais afastar as perspectivas de formação de um Estado, uma tentativa de desestimular os jovens a lutarem por algo chamado política pública? Até porque denúncia de corrupção não é nenhuma novidade da Era Collor, vide “As Vespas” e “Os Acarnenses”, peças teatrais de Aristófanes na (longíqua?) Atenas do século X aC.

Parece às vezes muito óbvio (ou não) que milionários grupos corporativos nacionais e estrangeiros que controlam a grande imprensa brasileira insistem em algumas “verdades”, lembro-me rapidamente de duas delas. A primeira, a de que tudo que seja público cheira à incapacidade, saúde, educação e outros setores públicos não prestam, são horripilantes, uma vergonha e não funcionam. Outra: nós brasileiros gastamos muito com impostos, somos indevidamente taxados, e essa dinheirama não é bem administrada, pois o aparato público-burocrático é ineficiente e possui enormes brechas para a prática da corrupção.

O que se poderia pensar como conclusão de afirmativas tão aparentemente óbvias? Vale muito à pena privatizar esses setores, diminuir a um patamar simbólico o poder do Estado, o que se seguiria uma severa diminuição de impostos e uma campanha de conscientização em massa para que o brasileiro alcance e incorpore um espírito liberal, empreendedor, de liderança, almejando sempre o top do que pode ser chamado, nesse caso, de céu: sucesso-riqueza.

O problema é que nem tudo é verdade no que diz respeito tanto à ineficiência dos setores públicos, quanto da injusta taxação de impostos no Brasil. No público, há os considerados centros de excelência, vide Fiocruz, USP, Unifesp, INCA etc. Concordo que a excelência precisa ser expandida, precisa ser desencastelada, concordo também que muitos setores públicos estão muito longe do que possamos entender sobre dignidade e respeito, mas daí sofismar que tudo é ruim, ridículo e limitado é uma imprudência sem tamanho. Principalmente num país em que o programa nacional de AIDS é referência no mundo e a política nacional de saúde (SUS) faz, dentre outras coisas, o Obama dizer “this is my man”.

Em relação à taxação de impostos, longe de ser um modelo tributário para o mundo, no entanto, o problema, segundo o Ipea, não está na quantidade de impostos, mas na distribuição da riqueza: para as famílias que recebem até 2 salários mínimos, 48,9% da renda é paga em impostos, por outro lado, para rendas familiares maiores que 15 mil reais/mês, apenas 26,3% são destinados ao tesouro público. Hoje em dia no país, os 10% mais ricos possuem 75% da riqueza nacional, impressionantemente mais do que no século XVIII, que em meio a uma sociedade colonial e escravocrata, os mais ricos levavam 69% do montante. Onde está o tesouro da mamãe?

Quando terminei o Ensino Médio, uma idéia que me martelava à época era o fato de ninguém da minha turma almejar uma carreira de professor do Ensino Infantil ou Fundamental. Em quem poderia estar confiando a educação dos meus futuros filhotes? Numa mesma linha de raciocínio, qual conhecido vem assumindo cargos públicos, quem é esse que vem me representando perante as questões referentes ao meu município, estado e país?

Dinamitar a idéia de se fazer política é destruir nossa capacidade de sonhar, de acreditar em nós mesmos, é manter a deprimente perspectiva de imobilidade dos sistemas econômicos, da desigualdade na distribuição das riquezas. É votar no “nada presta” e eleger o “fica como tá”.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

não precisamos de Pôncio Pilatos



Não, não crucificarei o Dunga, direi até que realizou uma escalação bastante razoável. Ganso, 20 anos e Neymar com 18 possuem bola, tesão e oportunidades suficientes para vestir Real Madrid, comprar porshe, e serem eleitos os melhores do mundo nesses próximos 4 anos. Peço pelo amor de Garrincha que tenham um porto seguro, seja igreja, família, ONG, algum ativismo anti-bélico-pró-ambiente para não correr o risco de calçarem tamancos ou se banharem compulsivamente com os talcos mais refinados do planeta.

Outros bambas da pelota surgirão, afinal de contas nenhum verde-amarelo quer ver o repeteco de um 1950, no recém-inaugurado Maracanã, que como já disse em outra crônica desse Riocife, significa um tipo de papagaio no tupi-guarani que faz um som semelhante (nã) a um chocalho (maraka). Até 2014, serão enxurradas de investimento para que a chacoalhada dê em samba. A Copa do Brasil e o Brasileirão serão torneios mais interessantes de se ver, posso presumir que haverá um maior esforço em aparecer por parte tanto da comissão técnica quanto dos jogadores e, para isso, uma concentração maior nos treinamentos, no aperfeiçoamento da mira, na calibragem para a conquista do alvo.

Mas voltemos à terra de Mandela, especialmente no jogo mais “não acredito” que vi nas últimas copas. Michel Bastos estava no seu melhor jogo, finalmente a esquerda brasileira estava começando a ficar jacobina, no entanto novamente fico com o Dunga, Michel estava muito preciso na marcação do pé esquerdo do espalhafatoso Robbens, que sensibilizava facilmente o juiz, possivelmente fã de carteirinha do teatro japonês. Um segundo amarelo estava pedindo para ser sacado do bolso da camisa preta. O Nilmar poderia ter entrado uns cinco minutos antes, mas tudo bem.

O que não consigo entender é que num mundo em que parece estar dando um upgrade geopolítico, onde há indícios, vindos do Brasil inclusive, em se negociar de forma mais responsável o desarmamento nuclear, num mundo onde a consciência de sustentabilidade ambiental está se multiplicando por entre os terráqueos, um voltarredondense chamado Felipe Melo consegue passar no psicotécnico do DETRAN e jogar com a camisa da seleção numa Copa do Mundo.

Após as últimas e suficientes diabruras com o alagoano Pepe (que também é da cachola dodói), no Portugal X Brasil, mesmo com Ramires suspenso, era pra Felipe Malvadeza já estar cumprindo crime futebolístico, recapeando a grama do estádio do Juventus, seu time atual... por enquanto. Até um goleiro reserva deveria ser escalado na sua posição após o jogo contra Portugal. Mas não quero crucificá-lo ao ponto de culpá-lo pela derrota, aliás fazer o que Pôncio Pilatos fazia parace ser mais mole que manteiga no verão.

Finalmente, acho que o bom time canarinho eleito pelo Dunga não estava preparado emocionalmente para um aperto de placar, comum em qualquer pelada, quanto mais numa Copa milionária. Definitivamente não se teve um clima de maturidade de alguém ali que “puxasse na grande” e cantasse: “desesperar jamais / cutucou por baixo o de cima cai / cutucou com jeito não levanta mais”. Coréia do Norte, Costa do Marfim, Portugal e Chile não prepararam o Brasil nesse sentido, e jogar na pressão contra a Holanda nas quartas, logo após um primeiro tempo dominado, nunca poderia ser descartado. Afinal de contas, contando com o Brasil de hoje, somam-se 23 jogos de invencibilidade. E nem quero falar da história da Laranja, confesso que prefiro até a versão do Kubrick.

Impossível como riocifense não comentar do compartilhamento da desilusão com figuras que vi há pouco nas ruas de Vila Isabel: o vendedor, de chapéu e bigode, totalmente atordoado com a quantidade de fé que havia assumido ao comprar toneladas de gelo e cerveja para vender na rua Pereira Nunes, e a de um garoto ensacolador do supermercado Premium, embalando nas sacolas arroz e xampu num desalento infinito e devorador de esperanças. No entanto, por cima desse semblante, um penteado punk-comportado não escondia a gana de acreditar em dias melhores.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

me salva, Drummond



Aventurei-me pela Zona da Mata mineira com o fiel e dileto escudeiro Felipe Camarão, a reencarnação do heróico potiguar que, segundo a história mitológica e descritiva da Metrópole, uniu-se aos portugueses e negros para expulsar de terras pernambucanas a progressista e protestante Holanda – a mesma que foi a 1ª- do Grupo E, e jogará contra a Eslováquia nas oitavas de final.
Gastamos quase meio dia para cruzarmos Juiz de Fora exageradamente falando. Confesso ter dificuldades com cidades de médio porte, posto que já possuem as explícitas desvantagens das capitais. Mais automóvel que rua, feiúra arquitetônica, privatizações escancaradas do espaço público, epidemia da síndrome do pânico entre a classe média, passeios no shopping e ameaças sórdidas, impostas por narcotraficantes e milicianos, aos cidadãos pobres das favelas.
Por outro lado, esses municípios grandes, porém pequenos, ainda não contêm o gordo cardápio de opções, da diversidade caótica das grandes cidades, albergando filme húngaro e lançamento de escritor moçambicano, tendo, na sala ao lado, um forró rabecado phsyco-trance. Por essas carências e outras ausências, sou bem a favor que se multipliquem centros culturais, mas que sejam centros-periferia, descentralizando, trocando, misturando-se. Os pontos de cultura, por exemplo, a depender do caráter democrático de suas gestões, parecem abrir cortinas de entusiasmo Brasil afora.
Enfatizo centros-periferia, pois não chego a sentir um clima democrático-cultural, por exemplo, por entre os jardins burlemarxianos, da beleza arquitetônica e tropical do Alto da Gávea na ex-mansão dos Moreira Salles, hoje Instituto Moreira Salles. Na guarita ainda me sinto visitando a família do influente banqueiro, seguranças Men in Black e headphones. No café, me sinto em Paris, um bistrô recheado de pessoas brancas, no mínimo bilíngües, um “menu” que afastaria qualquer família rocinhanense que estivesse, por acaso, querendo curtir um agradável fim de tarde.
Dia desses, nesse mesmo café, acompanhei de soslaio a conversa de senhoras viúvas ricas, aparentemente judias pelo tom da prosa: “(sobre o massacre recentemente realizado pelo exército israelense)... e estão fazendo isso logo contra quem? O ‘Glorioso’ exército de Israel... eles estavam errados, sabiam que era proibido aportar o navio...”. Voltemos a Minas, onde o porto mais próximo fica no Espírito Santo...
Rio Pomba, Ubá, Visconde do Rio Branco, Coimbra. Payol, “Coiotinho”, Guaraciaba Premium, Doce de Leite Viçosa, Pão de queijo molhado, quente e macio no café da manhã. Frio de rachar beiço. Foi no bar do Helinho que li emoldurado na parede um discurso de formatura do Nizan Guanaes para uma turma de publicidade: “tente trabalhar no que goste e nunca mais trabalhe na vida”. Carlos Drummond não poderia ficar de fora deste parágrafo: “Eta vida besta, meu Deus”.
“Vencer” e “Agir” estão escritos nas colunas de entrada da Universidade Federal de Viçosa. Dos cerca de 60 mil habitantes dessa cidade, perto da metade estão vinculados à vida universitária de alguma maneira. O campus é certamente um dos mais belos desse país, com direito a dois enormes lagos, construções modernistas e um conjunto de plantas ornamentais. O clima é de sol aberto e os ventos joviais criam um redemoinho de esperança, elevando nossa expectativa de vida.
Na mesma noite da chegada, fomos abençoados pelas águas do Mississipi em plena Zona da Mata mineira. Numa estação de trem desativada, um festival de blues alcançava seu último dia, onde pudemos compartilhar da felicidade da platéia em retirar as cadeiras enfileiradas na frente do palco, onde sentavam o prefeito e sua comitiva. O intuito foi o de ampliar a dança e os aplausos à última banda do festival, que não devia nada a nenhuma bluesband de New Orleans: Rodrigo Nézio & Duocondé Blues.
Após várias fichas de sinuca e doses de Guaraciaba, meu fiel escudeiro Felipe Camarão e eu encerramos as provas do concurso de professor para o recente Departamento de Medicina e Enfermagem, motivo da aventura. Ajudamos inclusive à coleção das “formas bizarras de se assistir ao jogo do Brasil na Copa”: contra a Coréia do Norte, a TV estava em “mute” e os laptops abertos. Dentro de um quarto de hotel, só aumentávamos o volume quando ouvíamos os gritos. A última etapa do concurso iria se iniciar ao término do segundo tempo.
Fomos aprovados, o Brasil reprovado, onde estava o Kaká na minha prova? Descobri que não perdemos muito, o beijo ardente de Maicon na aliança após o primeiro gol brasileiro selou o casamento da Seleção com a Nike. Na verdade, o matrimônio é poligâmico: aventuras amorosas com o Itaú (quem diria!); Guaraná Antarctica, como o energético loverman e a Vivo se disfarçando de Tiazinha malvada, não comentarei sobre o Gillette e outros participantes dessa orgia futebolística... Vampeta é que está certo em dizer que só quem pode reclamar da Jabulani são os goleiros e os invejosos do relacionamento estável entre a FIFA e o Adidas.
Voltamos certos de que só os bobinhos acreditam ainda em nações, que os jornalões brasileiros são os responsáveis pelos engarrafamentos de carros no país e que Luis Fabiano é um filho bastardo de Pelé.
Microsofteanos, nikeanos e cocacolenses, por favor, chamem novamente o Drummond: “Eta vida besta, meu Deus”.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

De feira que se vive

A feira é de cores e de vida: nada a ver com prateleira insossa de supermercado.


Por que contamos nos dedos o número de pessoas que riem, conversam entre estranhos, exercem o divino fascínio da brincadeira, do “sarro”, da “tiração de onda”, do “tá de sacanagem” nas farmácias, supermercados e mercadinhos? E por que há um quê de criança, que se aflora nos barrigudos de cabeças brancas, em cada barraca, pechincha por pechincha numa animação sem igual na sonolenta e devagar aurora de um sábado no meio da rua em Vila Isabel?

Em qual supermercado poderia eu brincar de abaixar o preço do mamão? O sujeito que mais ganha em cima do lucro daquele mamão não é o atravessador, que estacionou num canto proibido sua Kombi velha após o expediente do dia anterior e mandou que se depositassem as papayas. O tal sujeito dono da “bolsa de valores dos mamões” está bem longe dali, no mínimo em bela soneca numa king size qualquer, sonhando um montante de coisas caras num sentido, suspeito, bem vazio do que seja uma coisa cara. Talvez esteja em pesadelos: ilhas Fiji, Dom Perignon na suíte master do seu 78 pés, quando, de assombro, ao apertar olhos para melhor entender o porquê, passivamente assiste por detrás do vidraçal a uma tempestade. Pingos graúdos de ações trabalhistas. No canto direito um raio onde lê, dobrando o pescoço: “Subprime”, num raio de letras mais adiante “Greek Cracking”. Como assim? Pois é, pesadelos não são nada fáceis.

O importante é a feira: a carne, os peixes – tão fresquinhos que provocam arrepios nos vegetarianos dos mais – daqueles que só vão de frutas. Acho eu, no cume da minha ignorância, que aulas de artes plásticas sobre naturezas mortas, principalmente na especialidade de verduras e flores – sim! Há flores! E das mais amostradas. – deveria, ou deve, ou deverá também incluir como espaço de ensino a feira. Em dias de sol, lá está Ele planejando a iluminação do espetáculo, naquele naipe: nem frio, nem quente – naquela intensidade de cor que só o melhor iluminista do Sistema Solar sabe fazer. Imaginem a cara de delícia de um Monet ou Degas chegando cedinho e ensacolando paletas e pincéis no depois da tarde... Inclusive a rua a que me refiro possui o sugestivo nome de Rua dos Artistas.

Para crianças, aula de reforço gratuito: vermelho é vermelho, roxo é roxo. A sementinha da tangerina, peixes e galinhas e vaquinhas: o filão dos vertebrados (mas também não somos vertebrados, papai?). Ensinar, ô tarefa... Geralmente há um bacuri ali pelo caminho, acolá uma pequerrucha usando pequeninos brincos no colo da mãe, aprendendo novas cores – sabia lá, por exemplo, que existia o “branco das velhinhas do queijo”! E existe. Ficam lá, parecem irmãs, vestem-se e comportam-se como idôneas beatas católicas da época do latim, porém, observando-as mais de perto, descobri um quê de protestantismo neopentecostal na forma como elas abençoam as cédulas.

“Limão a 1 real, limão a 1 real” – aborda-lhe o insubmisso sujeito, vendendo nos corredores, não possui barraca. Subversivo típico de feira. Os pregões contaminam seus ouvidos e não por acaso o velho Caymmi atribuía aos pregadores da sua época potenciais estimulantes de insights fantásticos para suas composições.

Pois ando freqüentando com muita água na boca a feira dos sábados matinais na Rua dos Artistas em Vila Isabel – É mais caro que o Mundial, ou Guanabara? – Né não. Há penas um dos parcos espaços desse nosso planetinha onde coisas caras mudam totalmente de valor.

domingo, 6 de junho de 2010

O canteiro de obras do recomeço do mundo

No começo, máquinas leais aos homens reproduzem, em movimentos ágeis e robotizados, o rastro da revolução inglesa. Girafas mecânicas oferecem seios de aço às plataformas das embarcações de ferro e sol

Uma tribo movida a petróleo adormece à direita de quem passa. Hálito de sono quente, surpreendente paciência automotiva no labirinto de garagens

Girafas mecânicas se somam a trombas e chifres cenozóicos gerenciados por genomas de computadores primitivos

O clima é de recomeço: sopro de pássaro faminto de vôo içando vela de caravela, um alvorecer de águas arejando dia nascido, montanhas se banham ao sol, raios de luz escorrendo pelas encostas... Quantos dedos de Deus são necessários para desenhar o novo mundo?

À medida que se passa, de ambos os lados as máquinas vão perdendo suas dimensões de homem diante do pequeno infinito de silêncio. Gaivotas me passeiam, me oferecem uma visita ao encantado. Um tailandês sob o sol tempera a sal e saudade um linguado poliglota de águas profundas, uma mulata alemã invoca preces batistas da janela de uma aeronave que num rabo de rasante risca a parábola da manhã

De repente, chove no canteiro de obras do recomeço do mundo e a constelação de barcos vai se caramelando no azul-cinzento

Quantos sonhos cochila o marujo no convés daquela corveta distante? Quantas lágrimas de brandy restam no seu cantil?

Gaivotas me passeiam, me largam na corcunda da serpente de cimento e aço. De cima da corcunda não preciso de asas. A corcunda me gravita, avisto a passagem para o desconhecido. Por um instante me agasalho de esperança, abro um sorriso para a estrada

Reaparecem girafas mecânicas, trombas, chifres, fumaça de petróleo, giga-watts do incessante futuro que me ultrapassa, aposto corrida, sou ingurgitado da garganta da serpente, cimento e aço do meu carro na janela do pedágio: são 4 reais, reais demais para o canteiro de obras do recomeço do mundo.


(para “o tudo” que é visto de cima da ponte Rio-Niterói...)